O artigo
176 do Código Penal[1]
assim declara:
Tomar refeição em restaurante, alojar-se em hotel ou utilizar-se de meio de transporte sem dispor de recursos para efetuar o pagamento:
Pena - detenção, de quinze dias a dois meses, ou multa.
Todo dia 11
de agosto é dia de festa para os acadêmicos dos cursos de Direito do Brasil, é
o “Dia do Advogado”.
Em 11 de
agosto de 1827, por ato do Imperador Dom Pedro I, dois cursos jurídicos foram
fundados no Brasil. O respeito pela
profissão na época era tão grande, que donos de restaurante faziam questão de bancar a conta dos
estudantes de Direito.
Nesta data,
os comerciantes costumavam homenagear os estudantes de Direito, que eram quase
todos de famílias ricas, deixando-os
comer de graça, desta forma, faziam uma “média” com o intuito de atrair mais fregueses.
Nascia aí o
“Dia do Pendura”.
Nota-se
que, na época em que “o respeito pela profissão era tão grande”, os donos dos
bares e restaurantes, “faziam questão de não cobrar a conta dos estudantes”, ou
seja, havia uma livre disposição dos proprietários em oferecer tal benefício.
A tradição de
mais de 170 anos tornou-se a tradição de um crime, o crime de - estelionato - causando problemas para os
donos de bares e restaurantes brasileiros e infelizmente, na maioria dos casos
que chegam à Justiça, os estudantes são absolvidos.
Atualmente,
além de não haver motivos para o grande respeito pela profissão, não há a livre
disposição em oferecer tal benefício, de modo que tal imposição configura o crime,
tipificado no Código Penal como Fraude no Comércio.
Segundo a
Superintendente do Conselho Arbitral de São Paulo, Ana Paula Pastore:
“O Pendura é uma tentativa criminosa de permitir que justamente os profissionais que devem colaborar para a manutenção da ordem, não o façam.
“Só num país como o Brasil é que se permite uma atitude desrespeitosa, que causa prejuízos, que traz em si a institucionalização da bagunça”.
Interessante
notar que, ainda hoje, há os que defendem a “tradição do crime”, afirmando ser uma forma sadia com o intuito de confraternizar. Ora essa! A prática de um crime como uma
“forma sadia de confraternizar”?
O advogado
criminalista, professor de Direito Penal, mestre e doutor em Direito Penal pela
USP, Luíz Flávio Borges D'Urso, diz:
“O verdadeiro pendura, segundo a tradição, deve ser iniciado discretamente, com a entrada no restaurante, sem alarde, em pequenos grupos, para não chamar a atenção.
Após isso, o líder e orador, deverá levantar-se e começar a discursar, sempre saudando o estabelecimento e seu proprietário, agradecendo o "convite" e a hospitalidade, enaltecendo a data, os colegas, a faculdade de origem, o Direito e a Justiça, tudo isso, sob o estímulo dos aplausos e brindes dos demais colegas do grupo.
Esse é o verdadeiro pendura, que pode ser aceito ou rejeitado. Caso aceito, ficará um sabor de algo faltante! Agora se rejeitado, deve partir dos estudantes de direito a iniciativa de chamar a polícia e de preferência dirigindo-se todos à Delegacia mais próxima, o que lhes dará alguma vantagem pela neutralidade do terreno.
Deve-se procurar uma mesa em local central, quanto mais visível melhor. Prossegue-se, com bastante calma, observando-se cuidadosamente o cardápio, inclusive os preços, que sabe não irá desembolsar. O pedido deve ser normal, discreto, sem exageros, admitindo-se inclusive camarões e lagostas.”
Digno de nota é a utilização do conhecimento jurídico para o
cometimento do crime, que desta forma assim ensina o ilustre professor:
“No pendura, a refeição é realizada, todavia, o estudante deverá ter consigo dinheiro, cheque ou cartão de crédito, portanto, meios para pagar a refeição, descaracterizando o tipo penal e afastando o delito, de modo que, embora tenha condições para pagar, não o fará em respeito à tradição.
Todas inovações devem ser evitadas, preservando-se a tradição do pendura, com o indispensável discurso, rememorando o papel daqueles "moços" que fizeram os caminhos de nosso país, estimulando, assim, o empenho destes outros "moços", jovens, para que transformem os destinos da nação!”O artigo 176 do Código Penal diz que o crime se configura quando a pessoa não dispõe de recursos para efetuar o pagamento. Dessa forma, por analogia, o delinquente ao assaltar, que tenha recursos financeiros, deve fazer um discurso dizendo que só assalta por "tradição", portanto, não há crime.
Realmente,
numa nação corrupta, onde os ricos e poderosos valem-se de sua influência, nada
mais justo e adequado que essa “tradição do crime” seja mantida, pouco se
importando com a luta dos proprietários dos bares e restaurantes, que trabalham
de forma digna pagando seus impostos mesmo obtendo lucro ou prejuízo.
Além do mais, salvaguardar a "tradição", proporcionará o incentivo necessário para o empenho admirável dos "moços" para que transformem os destinos da nação!
Referências: