A primeira
sentença de morte da história da humanidade está registrada na Bíblia Sagrada no livro de Gênesis,
capítulo 3, versículos 17-19, quando Deus disse a Adão: “Visto que você escutou a voz
da sua esposa e comeu da árvore a respeito da qual lhe dei a ordem: ‘Não
coma dela’, maldito é o solo por sua causa. Em dor você comerá dos produtos
dele todos os dias da sua vida. Ele produzirá para você espinhos e
abrolhos, e você terá de comer a vegetação do campo. No suor do seu rosto
comerá pão, até que você volte ao solo, pois dele foi tirado. Porque você
é pó e ao pó voltará.”
Desde então, a morte passou a ser a questão mais
intrigante para os filósofos, devido às incertezas decorrentes de todo o seu
processo inicial e seu desenvolvimento.
No ramo das
ciências, a morte é estudada pela Tanatologia,
ciência que estuda todo o processo da morte, suas causas, fenômenos, circunstâncias,
mecanismos, seus diferentes estágios e suas consequências jurídicas. A morte representa um dos maiores enigmas da
existência humana.
O avanço das
pesquisas médicas, terapêuticas e tecnológicas, trouxe uma possibilidade de
adiamento do processo natural da morte. E com as insistentes e tão nobres
tentativas em manter o paciente vivo, inúmeras técnicas artificiais começaram a
ser amplamente utilizadas, surgindo questões éticas quanto ao seu uso excessivo
e a desconsideração do prolongamento do sofrimento do paciente.
A Bioética,
ramo da filosofia que estuda as questões referentes à vida humana, passou a
pesquisar e discutir problemas éticos decorrentes dos avanços tecnológicos e
sua aplicação na medicina. Dentre tais questões destacamos a Eutanásia, a Distanásia, a Ortotanásia
e a Mistanásia.
EUTANÁSIA
A Eutanásia é definida como a “conduta pela qual se traz a um paciente em
estado terminal, ou portador de enfermidade incurável que esteja em sofrimento
constante, uma morte rápida e sem dor.”
É considerada “homicídio piedoso”, entretanto, crime de homicídio tipificado
pelo Art. 121 do Código Penal, embora atenuado e chamado de homicídio
privilegiado, tendo sua pena diminuída, conforme assim declara o parágrafo 1º:
“Se o agente comete o crime impelido por
motivo de relevante valor social ou moral, ou sob o domínio de violenta emoção,
logo em seguida a injusta provocação da vítima, o juiz pode reduzir a pena de
um sexto a um terço.”
O Código de Ética Médica também proíbe o
médico de realizar a Eutanásia onde
declara que é vedado ao médico: Art. 41 –
“Abreviar a vida do paciente, ainda que a pedido deste ou de seu representante
legal.”
DISTANÁSIA
A Distanásia é o “prolongamento do processo da morte através de tratamentos
extraordinários que visam apenas prolongar a vida biológica do doente.”
Para Maria
Helena Diniz, “Pela distanásia, também
designada obstinação terapêutica ou futilidade médica, tudo deve ser feito
mesmo que cause sofrimento atroz ao paciente. Isso porque a distanásia é morte
lenta e com muito sofrimento. Trata-se do prolongamento exagerado da morte de
um paciente terminal ou tratamento inútil. Não visa prolongar a vida, mas sim o
processo de morte [...]”
É o procedimento
mais utilizado pelos profissionais da saúde, é considerada como obstinação
terapêutica ou futilidades médicas, e embora haja a boa intenção por parte dos
médicos em estender a vida do paciente terminal, há um prolongamento do próprio
processo da morte.
O Código de Ética Médica acrescentou o
parágrafo único ao Art. 41, onde aplicou princípios contra a prática da Distanásia:
“Parágrafo único. Nos casos de doença incurável e
terminal, deve o médico oferecer todos
os cuidados paliativos disponíveis sem empreender ações diagnósticas ou
terapêuticas inúteis ou obstinadas, levando sempre em consideração a
vontade expressa do paciente ou, na sua impossibilidade, a de seu representante
legal.”
ORTOTANÁSIA
A Ortotanásia é o oposto da Distanásia e pode ser definida como o “não prolongamento artificial do processo
natural de morte, onde o médico, sem provocar diretamente a morte do indivíduo,
suspende os tratamentos extraordinários que apenas trariam mais desconforto e
sofrimento ao doente, sem melhorias práticas. O objetivo da ortotanásia é
contribuir para que o processo natural de morte desenvolva o seu curso natural.”
Segundo Goldim, “A ortotanásia poderia ser associada, caso
fosse um termo amplamente, adotado aos cuidados paliativos adequados prestados
aos pacientes nos momentos finais de suas vidas.”
Segundo Maria
Celeste Santos, não há “omissão de
socorro”, uma vez que o paciente não necessita de socorro, pois uma “assistência extremada seria ineficaz para
impedir a morte que se acerca. Nestes casos se fez tudo o que era possível
fazer”.
A Ortotanásia
não é considerada uma prática ilícita pelo ordenamento jurídico brasileiro.
Pelo contrário, atualmente é reconhecida e amplamente aceita pela classe
médica.
A OMS
(Organização Mundial da Saúde) definiu em 2002 o tratamento Cuidados Paliativos, que envolve uma
série de ações terapêuticas de forma a aliviar o sofrimento do paciente em fase
terminal.
O termo Cuidados Paliativos refere-se ao “alívio do sofrimento, a compaixão pelo
doente e seus familiares, o controle impecável dos sintomas e da dor, a busca
pela autonomia e pela manutenção de uma vida ativa enquanto ela durar: esses
são alguns dos princípios dos Cuidados Paliativos que, finalmente, começam a
ser reconhecidos em todas as esferas da sociedade brasileira.”
O objetivo dos
cuidados paliativos é o de fornecer a melhor qualidade possível para o paciente
e seus familiares e sua filosofia segue os seguintes princípios: “(1) afirmar a vida e encarar o morrer como
um processo normal; (2) não apressar nem adiar a morte; (3) procurar aliviar a
dor e outros sintomas angustiantes; (4) integrar os aspectos psicológicos e
espirituais nos cuidados do paciente; (5) oferecer um sistema de apoio para
ajudar os pacientes a viver ativamente tanto quanto possível até a morte; (6)
disponibilizar um sistema de apoio para ajudar a família a lidar com a doença
do paciente e com o seu próprio luto.”
Nada mais é do
que a Ortotanásia, sob o amparo legal
do parágrafo único do Art, 41 do Código de Ética Médica que proíbe o médico da
prática da Distanásia.
MISTANÁSIA
A Mistanásia “representa a morte miserável, antes da hora, conhecida como eutanásia
social. Pode ocorrer em casos de omissão de socorro, erro médico, negligência,
imprudência e imperícia.”
É um problema
social, onde as vítimas sofrem de exclusão social e econômica. Pode ser
considerada como um atentado à Dignidade Humana.
“Trata-se da “vida abreviada” de muitos, em nível
social, por causa da pobreza, violência, droga, chacinas, falta de
infraestrutura e condições mínimas de se ter uma vida digna, entre outras
causas.”
DIGNIDADE HUMANA
O princípio fundamental
da Dignidade Humana está determinado no
inciso III, do Art. 1º da Constituição Federal e por ser um princípio
constitucional deve, portanto, prevalecer sobre qualquer outro princípio
infraconstitucional. Envolve a capacidade de autodeterminação do indivíduo, ou
seja, o de decidir livremente sobre sua própria vida e sobre a sua própria
morte.