O Estatuto da Criança e do Adolescente[1] define criança como sendo a pessoa até doze anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade. Ambos gozam de todos os direitos fundametais inerentes à pessoa humana e esses direitos devem ser protegidos por Lei a fim de lhes conceder o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.
Com o objetivo
incentivar os países membros a implementarem o desenvolvimento pleno e
harmônico da personalidade de suas crianças, preparando-as plenamente para
viverem uma vida individual em sociedade e serem educadas no espírito dos
ideais proclamados na Carta das Nações Unidas, em espírito de paz, dignidade,
tolerância, liberdade, igualdade e solidariedade, a Convenção sobre os Direitos da Criança[2]
declara que os Estados Partes assegurarão à criança que estiver capacitada a
formular seus próprios juízos, o direito de expressar suas opiniões livremente
sobre todos os assuntos relacionados com a criança, levando-se devidamente em
consideração essas opiniões, em função da idade e maturidade da criança.
Teoria do menor amadurecido
A
Convenção trata do direito à livre expressão de opiniões, pensamento e crenças
das crianças e dos adolescentes, respeitados os direitos alheios, tal liberdade
garante ao menor o direito de ser ouvido,
bem como de ter seu direito de escolha respeitado. Os Estados Partes
respeitarão o direito da criança à liberdade de pensamento, de consciência e de
crença, respeitarão os direitos e deveres dos pais e, se for o caso, dos
representantes legais, de orientar a criança com relação ao exercício de seus
direitos de acordo com a evolução de sua
capacidade. A criança deve ser livre para ter opiniões sobre todas as
questões que lhe digam respeito, opinião essa que deve ser devidamente tomada
em consideração de acordo com a sua idade
e maturidade. Este princípio se baseia na ideia de que as crianças têm o
direito de serem ouvidas e que as suas opiniões sejam seriamente levadas em
consideração, incluindo em qualquer processo judiciário ou administrativo que as
afetem. Quando os tribunais, instituições de segurança social ou autoridades
administrativas lidarem com crianças, o interesse superior da criança deve
consistir numa consideração primordial.
A teoria
do menor amadurecido deve ser analisada sob o olhar bioético e humanista e, embora
pouco conhecida no Brasil, já é aplicada em países como Espanha, Estados Unidos
da América e Inglaterra, e vem ganhando espaço no âmbito do intervencionismo
médico, em diversas situações. O conceito de menor maduro foi instituído por
volta de 1970, nos Estados Unidos e desenvolveu-se progressivamente na
literatura bioética-médica-jurídica.
A teoria
do menor amadurecido reconhece que existe um subgrupo de adolescentes que têm
maturidade e inteligência suficiente para compreender os benefícios, riscos e
probabilidade de sucesso e insucesso das intervenções médicas, bem como de
outras opções terapêuticas existentes, podendo raciocinar e escolher de forma
livre e voluntária.
A maioria
dos Estados possuem Estatutos do Menor Amadurecido onde a idade do menor, a
maturidade geral, habilidades cognitivas, situação social, bem como a gravidade
da situação médica são levadas em consideração em uma determinação judicial, a
fim de identificar se um menor juridicamente incapaz é suficientemente maduro
para tomar uma decisão de modo a dar o seu próprio consentimento para os cuidados
médicos necessários.
Vale
ressaltar que o processo de desenvolvimento do julgamento moral e as
transformações progressivas na estrutura cognitiva não estão relacionadas
diretamente com idade, podendo haver variações conforme os níveis evolutivos
mediante o resultado da interação do indivíduo com o meio social.
Embora
comumente utilizado na prática com adultos, o julgamento substittutivo é incomum
para a tomada de decisões no cenário pediátrico. Uma exceção ocorre quando adolescentes
maduros, geralmente com doenças crônicas, expressam seus desejos sobre determinados
procedimentos médicos antes da deterioração de suas funções cognitivas. Esses
desejos podem ser respeitados pelos pais e médicos de um modo semelhante ao julgamento
substitutivo de tomada de decisão para adultos. A oportunidade de fornecer
orientações sobre os seus cuidados médicos futuros devem ser discutidos durante
seus cuidados de saúde em curso de uma maneira consistente com o seu
desenvolvimento cognitivo e sua maturidade.
A tomada
de decisões dos adolescentes depende de vários fatores, o que inclui a
capacidade cognitiva, a maturidade do julgamento e a autoridade moral. Muitos
menores atingem um estágio operacional do desenvolvimento cognitivo que permite
o pensamento abstrato e a capacidade de lidar com tarefas de alta complexidade
comuns para adolescentes mais velhos. A remodelação do cérebro com a melhora da
conectividade geralmente se dá através da terceira década da vida, sendo que o
córtex pré-frontal, local das funções executivas e controle de impulsos está
entre os últimos a amadurecer. Em contraste, as áreas responsáveis por assumir
riscos e a busca por emoções (regiões límbicas e paralímbicas) se desenvolvem em torno
da puberdade. Este desequilíbrio temporal entre os dois sistemas pode levar a
comportamentos de risco comuns na adolescência.
Embora
ainda não exista uma linha clara que determine quando um menor se torna
suficientemente "maduro" para tomar decisões de forma independente quanto
aos critérios envolvidos no consentimento informado ou recusa, os tribunais têm
considerado esta questão com uma variedade de resultados. Quando persistirem
conflitos sobre o tipo de tratamento, apesar da orientação do médico e a estreita
colaboração com o paciente e sua família, a equipe deve consultar profissionais
da ética, psicólogos, psiquiatras e quando apropriado, uma equipe de cuidados
paliativos. Uma intervenção judicial deve
ser sempre a última opção.
O mais
notável pesquisador do desenvolvimento cognitivo infantil foi o psicólogo e
filósofo suiço Jean Piaget[3].
Piaget iniciou seus estudos experimentais sobre a mente humana e começou a
pesquisar também sobre o desenvolvimento das habilidades cognitivas. Seu
conhecimento em Biologia levou-o a enxergar o desenvolvimento cognitivo de uma
criança como sendo uma evolução gradativa. Ele revolucionou as concepções
de inteligência e de desenvolvimento cognitivo partindo de pesquisas baseadas
na observação e em entrevistas que realizou com crianças. Interessou-se
fundamentalmente pelas relações que se estabelecem entre o sujeito que conhece e
o mundo que tenta conhecer. Sua teoria consiste na classificação de
quatro estágios de desenvolvimento onde o conhecimento se desenvolve e aumenta
até alcançar o ponto onde se torna completamente eficaz. Os estágios são
influenciados pelo autoaprendizado e pela educação. O último estágio de
desenvolvimento ocorre entre os onze e quinze anos, pelo qual a criança adquire
pensamento independente, está apta a tirar conclusões e compreender teorias. A
partir dos quinze anos a criança está num estágio de maturidade que inclui o
processo do pensamento maduro.
Mais
recentemente, alguns pesquisadores da área do comportamento adolescente
concluíram que o processo de tomada de decisão dos adolescentes de quatorze
anos pode ser comparado ao dos adultos, e que quanto mais velho o adolescente
mais consideração dará aos riscos e às consequências futuras. Também concluíram
que a habilidade de comparar informações melhora entre os dez e os treze anos.
Entretanto, embora os pesquisadores concordem que a sociedade e o ambiente influenciam
o desenvolvimento do adolescente, eles divergem tanto em quanto, quando e em que proporção isto ocorre. Elizabeth Scott[4], professora
de Direito da Universidade de Columbia, declara que muitos estudos referentes à
avaliação da capacidade dos adolescentes em tomar decisões, falham por não
levar em consideração a influência dos colegas, a tendência em focar nas coisas
imediatas e não nas consequências a longo prazo, além da inclinação em fazer
escolhas arriscadas.
O Comitê de Bioética da Academia Americana de
Pediatria (AAP)[5],
publicou seu posicionamento reconhecendo a habilidade da criança e sua
capacidade em fazer escolhas de tratamento em situações de preservação da vida e
incluiu orientações para os médicos. Embora as orientações declaram que os
menores que possuem a capacidade de tomar decisões devem ser informados e devem
decidir sobre os cuidados médicos a que serão submetidos, não explicam de que
forma essas orientações devem ser implementadas mas definem a capacidade de
tomar decisões como sendo: a habilidade de entender e comunicar informação
relevante para uma decisão; a habilidade de raciocinar e deliberar a respeito
da decisão; e a habilidade de aplicar um conjunto de valores para uma decisão
que possa envolver elementos conflitantes. Porém, não há uma discussão sobre
como essas determinações devem ser feitas, quem fará a determinação ou quem finalmente
decidirá que a capacidade do menor é suficientemente adequada para rejeitar o
tratamento.
O Centro para a Bioética Prática[6] baseou
seu modelo na hipótese de que a idade não determina necessariamente a
capacidade de tomar decisão, as crianças não são propriedade de seus pais, os
menores possuem condição moral e posição legal independentes e os menores amadurecidos
devem ser conduzidos por uma presunção de capacidade. Isto sugere que as
crianças deve ser envolvidas nas decisões com respeito aos cuidados com a sua
saúde e que o paciente menor deve ser incluído no processo do consentimento
informado. Deve haver uma relação dialógica entre médico-paciente e médico-pais
ou responsável legal e quando surgir
desacordos entre a criança e seus pais, o centro sugere que conversar com outro
prestador de serviços de saúde ou consultar o comitê de ética do hospital pode
ajudar a resolver o conflito.
Os tribunais
são notoriamente inconsistentes na utilização de um modelo de prova necessário
para a aplicação da doutrina do menor amadurecido. Alguns tribunais têm
confiado no teste de evidência clara e convincente que prove a maturidade do
menor. Os tribunais têm também aplicado o modelo da Rule of Sevens (do inglês “Regra dos Sete”), derivado da Common Law (do inglês "direito comum"). Esta regra se
baseia na habilidade de raciocínio da criança e apóia a hipótese de que a
criança maior de quatorze anos tem a capacidade de dar o seu consentimento para
um determinado tratamento médico. A regra divide os menores em três grupos:
- crianças menores de sete anos são absolutamente incapazes de formular uma intenção criminosa e não podem ser culpadas de crime, uma vez que falta o desenvolvimento cognitivo necessário para uma tomada de decisão autônoma;
- crianças entre sete e quatorze anos, apesar de serem consideradas capazes de distinguir o certo do errado, são presumidamente consideradas relativamente incapazes de formular uma intenção criminosa;
- crianças maiores de quatorze anos são presumidamente consideradas capazes e são socialmente e legalmente responsáveis por suas ações.
Embora
muitos tribunais concordam com as presunções utilizadas na “Regra dos Sete”,
estas não são consistentes nos métodos utilizados para sua determinação. O
tribunal de Illinois, por exemplo, tem se concentrado na capacidade do menor em
compreender suas próprias ações. Nova Iorque tenta identificar se o menor já
atingiu a “idade da discrição”, ou seja, aquela sujeita a certos direitos e
obrigações. O tribunal da Pensilvânia se baseia no fato de o menor responder
questões sem nenhuma hesitação e aparenta compreender os benefícios e/ou
complicações de um procedimento, bem como se concorda ou discorda. No
Tennessee, o tribunal analisa se o menor tem maturidade, experiência, educação
e julgamento para fazer uma decisão com respeito ao tratamento médico.
Aparentemente,
mesmo quando os tribunais reconhecem a doutrina do menor amadurecido, as
decisões são sempre baseadas não especificamente no fato de o menor ter sido
determinado maduro, mas no critério adicional conforme as opiniões citadas. Os
tribunais permitirão eventualmente a recusa de tratamento por um menor, se pelo
menos um dos pais concordar com a decisão do menor, ou se o menor estiver a
poucos meses de completar os dezoito anos de idade, ou ainda, se o menor tiver
expressado seu desejo e esse desejo for apoiado pelos seus pais.
Na
maioria dos casos, os tribunais somente deferem a recusa do menor ao tratamento
se um ou ambos os pais concordam com a decisão. Uma decisão madura e razoável
dos pais, seja ela qual for, feita após consulta com os médicos e,
possivelmente, com um membro do comitê de bioética do hospital deve ser
honrada, evitando-se a agonia e o tempo envolvido em um desgastante processo
judicial. Os pais conhecem seus filhos e geralmente estão em melhores condições
do que outros para entender as necessidades específicas dos seus filhos e cuidar
das decisões sobre os cuidados da saúde do menor.
A Convenção Europeia sobre o Exercício dos
Direitos das Crianças (1996)[7] já estabelece a relevância da opinião e a
possibilidade de consentimento do menor, pois reconhece que as crianças devem permitir
que seus direitos e interesses sejam promovidos e que suas opiniões devem ser
levadas em consideração; reconhece a importância do papel parental na
proteção e promoção dos direitos e do superior interesse das crianças, e que,
se necessário, os Estados devem participar nessa proteção e promoção; além do
mais considera que, em caso de conflito, é desejável que as famílias cheguem a
acordo antes de submeter a questão a uma autoridade judicial. Assim declara:
ARTIGO 3 - Direito a ser informada e de exprimir as suas opiniões no âmbito dos
processos - À criança que à luz do direito interno se considere ter
discernimento suficiente deverão ser concedidos, nos processos perante uma
autoridade judicial que lhe digam respeito, os seguintes direitos, cujo
exercício ela pode solicitar:
- Obter todas as informações relevantes;
- Ser consultada e exprimir a sua opinião;
- Ser informada sobre as possíveis consequências de se agir em conformidade com a sua opinião, bem como sobre as possíveis consequências de qualquer decisão
que digam respeito
a uma criança, a autoridade judicial antes de tomar uma decisão deverá:
- Verificar se dispõe de informação suficiente para tomar uma decisão no superior interesse da criança e, se necessário, obter mais informações, nomeadamente junto dos titulares de responsabilidades parentais;
- Caso à luz do direito interno se considere que a criança tem discernimento suficiente: Assegurar que a criança recebeu toda a informação relevante; Consultar pessoalmente a criança nos casos apropriados, se necessário em privado, diretamente ou através de outras pessoas ou entidades, numa forma adequada à capacidade de discernimento da criança, a menos que tal seja manifestamente contrário ao interesse superior da criança; Permitir que a criança exprima a sua opinião;
- Ter devidamente em conta as opiniões expressas pela criança
1. No
caso de processos perante uma autoridade judicial, que digam respeito a uma
criança, o representante deverá, desde que tal não seja manifestamente
contrário ao interesse superior da criança:
- Dar à criança todas as informações relevantes, se à luz do direito interno se considerar que a criança tem discernimento suficiente;
- Explicar à criança as possíveis consequências de se agir em conformidade com a sua opinião, bem como as possíveis consequências de qualquer ação por parte do representante, se à luz do direito interno se considerar que a criança tem suficiente discernimento suficiente;
- Apurar a opinião da criança e transmiti-la à autoridade judicial.
Assim
sendo, nos termos da lei, se um menor não tiver capacidade para consentir numa
intervenção, esta não poderá ser realizada sem a autorização do seu representante,
de uma autoridade ou de uma pessoa ou instância designada pela lei. A opinião
do menor é tomada em consideração como um fator cada vez mais determinante, em
função da sua idade e do seu grau de maturidade . Portanto, não se deve
mencionar a retirada do exercício do poder familiar (ou do responsável legal)
em relação ao filho menor, mas a participação deste na tomada de decisão,
mediante a constatação de sua capacidade de discernimento conforme aquisição de
maturidade.
A
participação ativa na tomada de decisões respeita, ainda, o direito à
informação, incluindo o paciente pediátrico em ser informado sobre seu estado
de saúde. A capacidade do menor respalda-se no princípio bioético da autonomia
de vontade em que o menor demonstre a consciência moral para percepção e construção
de um juízo de valor.
Entretanto,
para que ocorra esta observância no consentimento livre e esclarecido do menor
em razão da sua autonomia de vontade como paciente, é necessário que sua saúde
esteja em condições à compreensão de entendimento sobre seu estado de saúde e
sobre os riscos e benefícios que o intervencionismo médico lhe causará, agindo
com a anuência de seus pais ou responsável legal na decisão sobre o âmbito da
saúde, uma vez que não havendo a constatação de tal capacidade, a decisão recai
sobre os pais ou responsável legal pela falta de autonomia decisória do menor.
Em todos os
estados, pais de adolescentes, semelhante a outros pais, são considerados os
responsáveis pelas decisões adequadas para os seus filhos e pode dar o
consentimento informado para tratamento médico de seu filho. No campo da
pediatria, nota-se a funcionalidade desta teoria para prevalência dos direitos
fundamentais do menor, neles compreendidos o direito à saúde, à vida e à
dignidade humana, respeitando-se a autonomia de vontade do paciente por meio do
consentimento livre e informado na escolha do tratamento. O consentimento
informado deve ser visto como uma parte essencial da prática pediátrica de
cuidados da saúde e a autorização dos pais e o parecer favorável do menor é um
processo fundamental para aumentar a inclusão do parecer da criança e do
adolescente na tomada de decisão médica na prática clínica e na pesquisa.
Segundo o
Comitê de Bioética da Academia Americana
de Pediatria, os médicos devem envolver os pacientes pediátricos em seus
cuidados de saúde na tomada de decisões, fornecendo informações sobre sua
doença, opções de diagnóstico e tratamento, de uma forma adequada ao
desenvolvimento, buscando parecer favorável sobre os cuidados médicos sempre que
necessário.
Os pais
devem, geralmente, ser reconhecidos como os decisores apropriados éticos e
legais para seus filhos menores. Este reconhecimento afirma a compreensão íntima
dos pais nos interesses de seus filhos e respeita a importância da autonomia da
família. A substituição na tomada de decisão por parte dos pais ou responsáveis
para pacientes pediátricos, deve procurar maximizar os benefícios para a
criança através do equilíbrio entre os cuidados necessários da saúde com as
necessidades sociais e emocionais no contexto das metas gerais da família, valores, crenças religiosas e culturais.
Os
médicos devem reconhecer que alguns pacientes pediátricos, especialmente os
adolescentes mais velhos e aqueles com experiência médica por causa de doença
crônica, podem possuir a capacidade cognitiva e de julgamento adequados para
participar efetivamente no processo do consentimento ou de recusa informada
para os objetivos propostos de atendimento. Deve haver uma comunicação contínua
com o paciente, representantes e a equipe médica para esclarecer os valores e os
objetivos do tratamento. Os médicos têm uma obrigação moral e ética, além de uma
responsabilidade legal para questionar
e, se necessário, contestar as
decisões médicas do paciente e do representante se esta decisão colocar o
paciente em risco significativo de danos graves (nota-se que há a obrigação de questionar e contestar mas não a de
decidir). Os médicos devem perceber que o consentimento informado para
permissão, aprovação ou recusa constitui um processo, não um evento discreto, e
requer a partilha de informação e comunicação entre médico-paciente-família.
A RECOMENDAÇÃO CFM Nº 1/2016[8]
traz os elementos do consentimento livre e esclarecido iniciais, informativos, a compreensão da informação e a capacidade para consentir. E os critérios
para a obtenção do consentimento livre e esclarecido são expressos em três
fases:
- Elementos iniciais: são as condições prévias que tornam possível o consentimento livre e esclarecido, quais sejam: efetivação das condições para que o paciente possa entender e decidir e a voluntariedade ao decidir, ou seja, a liberdade do paciente para adotar uma decisão.
- Elementos informativos, ou seja, a exposição da informação material, com a explicação da situação, recomendações e indicações diagnósticas e terapêuticas. A informação material inclui dados sobre diagnóstico, natureza e objetivos da intervenção diagnóstica ou terapêutica necessária e indicada, alternativas, riscos, benefícios, recomendações e duração. Os elementos informativos devem ser esclarecedores, a fim de propiciar uma decisão autônoma. A autonomia de decidir depende da compreensão da informação, o que não significa informação de detalhes técnicos desnecessários.
- Compreensão da informação: apenas ocorre se os dois primeiros elementos estiverem consolidados. O ato do consentimento, em si, compreende a decisão a favor, ou contra, do plano diagnóstico-terapêutico proposto e/ou a escolha entre as alternativas propostas. Os pacientes estarão aptos a tomar uma decisão livre e autônoma se tiverem condições para entender a informação material, julgá-la em relação a seus valores, pretender certo resultado e comunicar, livre e coerentemente, seus desejos ao médico, manifestando sua voluntariedade. Quando houver dúvidas sobre as condições do paciente para decidir, é útil considerar que, para consentir, o paciente tem de ser capaz de processar e entender a informação material sobre sua situação; compreender, em linhas gerais, no que consiste o plano terapêutico que lhe está sendo proposto; e ponderar os possíveis riscos e benefícios, para tomar decisão com base nesta reflexão e comunicá-la ao médico.
Segundo a
recomendação do CFM, a capacidade constitui elemento básico do consentimento e
pode ser definida como a aptidão necessária para que uma pessoa exerça,
pessoalmente, os atos da vida civil.
O menor
com idade compreendida entre 16 e 18 anos é considerado relativamente incapaz,
o que implica que será assistido por seus pais, devendo, em certas situações,
ser também levada em consideração a manifestação dos pais.
Sob o
prisma ético, consoante disposto no Código de Ética Médica, para a garantia da
validade moral do consentimento dado, no caso de uma intervenção médica
preventiva, diagnóstica ou terapêutica, sempre deverá ser considerada a opinião
do paciente. A escolha do paciente será considerada na medida de sua capacidade
de decisão individual, com base no domínio de diversas habilidades, entre as
quais o envolvimento com o assunto, a compreensão das alternativas e a
possibilidade de comunicação de uma preferência .
A
participação do menor na obtenção do assentimento livre e esclarecido deve ser
incentivada: o Estatuto da Criança e do Adolescente garante-lhe a liberdade de
opinião e a expressão e o direito ao respeito de sua autonomia, sendo que,
durante o processo, serão levadas em consideração sua idade e maturidade
intelectual e emocional.
O
critério para a determinação da capacidade para consentir, ou mesmo para
recusar, compreende a avaliação da habilidade do indivíduo para, ao receber
informações, processá-las de modo a compreender as questões postas e avaliar
racionalmente as possibilidades apresentadas, ou seja, avaliar valores,
entender riscos, consequências e benefícios do tratamento cirúrgico ou
terapêutico a que será submetido.
A
capacidade será sempre presumida, devendo ser comprovada apenas a incapacidade
sempre que surgirem evidências desse estado.
Considerações finais
A Convenção, suas metas e objetivos devem ser amplamente divulgadas aos cidadãos
nacionais, sob pena de flagrante descumprimento do instrumento ratificado. Organizações
não Governamentais, grupo de estudos jurídicos, Grupo de Trabalho de Direitos
Humanos da Procuradoria Geral do Estado e muitas outras entidades de proteção
dos Direitos Humanos, devem priorizar a divulgação dos textos das Convenções e
Tratados internacionais sobre Direitos Humanos, chamando atenção do país para o
cumprimento dos ideais e das metas de que é compromissário.
_________________
[1] Estatuto da Criança e do
Adolescente. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8069.htm
[2] Convenção sobre os Direitos
da Criança. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/D99710.htm
[3] Portal Educação. Jean Piaget. Disponível em: http://www.portaleducacao.com.br/psicologia/artigos/53974/jean-piaget-biografia
[4] Columbia Law School. Elizabeth Scott. Disponível em: http://web.law.columbia.edu/faculty/elizabeth-scott
[5] American Academy of Pediatrics. Disponível em: http://www2.aap.org/sections/bioethics/Committee.cfm
[6] Caring Community. Disponível em: http://www.caringcommunity.org/helpful-resources/models-research/midwest-bioethics-centercenter-for-practical-bioethics/
[7] Tratados em Direitos Humanos. Disponível em: http://www.internacional.mpf.mp.br/links-tematicos/colecao-mpf-internacional-1/tratados-em-direitos-humanos-vol-4
[8] RECOMENDAÇÃO CFM Nº 1/2016.
Item 7. Disponível em: http://portal.cfm.org.br/images/Recomendacoes/1_2016.pdf
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Referências Bibliográficas:
Ann Eileen Driggs, R.N. THE MATURE MINOR DOCTRINE: DO ADOLESCENTS HAVE THE RIGHT TO DIE?