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segunda-feira, 26 de novembro de 2018

A empatia e o paternalismo médico




No dia 21 de novembro de 2018, o Conselho Federal de Medicina (CFM) fez uma postagem em comemoração ao Dia Nacional da Homeopatia[1], especialidade médica reconhecida pelo CFM desde 1980. Eu, como gosto da Homeopatia, fiz um comentário na postagem dizendo que a homeopatia já é comprovada há anos e que inclusive a utilizo nos meus animais. Como já era de se esperar, fui expressamente massacrada por estudantes de medicina e médicos residentes enfurecidos, em sua maioria. Os demais comentários negativos também foram dirigidos ao próprio CFM.

Não vem ao caso a minha preferência pessoal, mas o que me chamou a atenção foi notar a agressividade dos estudantes com relação à minha opinião, sob o argumento de que a minha opinião “tem potencial de causar dano a um paciente por ser baseada em evidências equivocadas.”  - Obviamente essa pessoa não está interessada no dano que uma decisão possa causar a alguém, mesmo que equivocada, ...sendo evidente que o que ele quer, de fato, é ratificar sua opinião própria como sendo a melhor baseada em evidências científicas.

Meu objetivo aqui não é tratar de evidências científicas, mas de algo que considero muito maior, o respeito. O incidente mencionado acima me faz imaginar como esse jovens médicos, que não respeitam nem mesmo a autarquia que fiscaliza, regulamenta e exerce funções de interesse da classe médica, tratarão seus pacientes? 

A empatia já é de longe, uma das qualidades que mais está em escassez nos tempos atuais. É possível notar que, geração após geração tem aumentado o egoísmo, o egocentrismo e a falta de respeito de forma generalizada. As pessoas não respeitam os mais velhos, nem as vagas especiais, não se importam com os direitos dos outros, ou seja, vivemos em um mundo onde “as pessoas só enxergam seus próprios umbigos”, mas exigem seus direitos de forma fervorosa quando algo os afeta direta e pessoalmente.

A empatia  é a qualidade de se colocar no lugar do outro, são reações cognitivas e emocionais diante das situações vivenciadas pelo semelhante, de forma a projetar-se emocionalmente para a pessoa observada, sendo capaz de imaginar como agiria se estivesse naquela mesma situação.

Acredito que muitas pessoas já tiveram experiências ruins com médicos também ruins, e isso não tem relação com a idade do médico ou seu tempo de formação. Há experiências boas e ruins com médicos experientes e com jovens médicos ou recém-formados, isso apenas confirma que a empatia pode ser aprendida e desenvolvida com uma boa educação, mas isso é muito pessoal e se não houver interesse e incentivo, é possível morrer sem ela.

A empatia pode enriquecer a prática médica e deve ser discutida de forma sistemática nos estudos da relação médico-paciente na formação de novos médicos, a fim de treiná-los em suas qualidades humanísticas, uma vez que tem importância fundamental para a efetividade dos processos diagnósticos e terapêuticos, indispensáveis para o profissional da saúde. O médico tem o dever de respeitar os sentimentos e as escolhas dos pacientes. Entretanto, o que se tem notado é que o humanismo da profissão perdeu-se na ingenuidade romântica do sonho da graduação.

Estudos mostram que a empatia dos estudantes de medicina revelam uma deterioração das habilidades empáticas dos estudantes em anos mais avançados do curso. (O estudo tratou das causas, mas as causas não são relevantes para o assunto abordado aqui).

O curso de medicina sempre esteve no topo das carreiras mais concorridas nos vestibulares. Por que todo mundo quer ser médico? Basta fazer uma pesquisa amadora pela internet para verificar que a causa principal não é a vocação ou o desejo de ajudar pessoas, mas sim, o status da profissão, a vaidade e o culto à personalidade, etc.

O médico se sente superior às outras pessoas e isso é cultural e bem antigo, porém, quando ele encontra um paciente que não aceita se submeter às suas regras, ele se sente subjugado e humilhado. Isso é um grande equívoco, pois respeitar o direito do paciente não o coloca em situação inferior.

Quando a tomada de decisão médica desconsidera a opinião do paciente plenamente capaz constitui-se  uma conduta unilateral, chamada de paternalismo médico. Quando o princípio da beneficência não respeita o princípio da autonomia do paciente, isso resulta em ações paternalistas.

O paternalismo médico tornou-se uma tradição hipocrática e ainda é algo amplamente difundido pelos mestres das escolas médicas, de forma que os estudantes de medicina são incentivados a tomarem decisões, que consideram ser as melhores para os pacientes, mesmo sem os consultarem ou obterem seu consentimento.

A beneficência é um princípio bioético que se constitui em uma das prerrogativas do exercício da medicina e diz respeito a agir no melhor interesse do paciente. O respeito à pessoa do paciente é elemento essencial na ética deontológica central da medicina e assim deve ser também na prática.

Não sou contra a medicina nem contra os médicos (isso seria uma insanidade), pelo contrário, sou contra a atitude paternalista de certos médicos arrogantes, que se consideram semi-deuses e querem impor sua opinião à força em seus pacientes vulneráveis.

Conheço e já fui atendida por muitos médicos excelentes, mas também já deixei alguns falando sozinho no consultório, pois nem no meu rosto olhou. Por outro lado, há médicos que realmente exercem a medicina por vocação e isso é nítido pela maneira como tratam seus pacientes.

Todos podemos atingir a excelência profissional por utilizarmos nossos conhecimentos com sabedoria e respeito. Não vivemos mais em uma sociedade ignorante como a do passado, onde as pessoas sequer conheciam seus direitos. Vivemos hoje em um mundo globalizado com acesso rápido à informação, isso é excelente mas certamente incomoda muitas pessoas.

As pessoas, em especial os pacientes, querem ser tratados e não apenas curados. Os médicos precisam entender que não são deuses e o poder da cura não está em suas mãos, portanto, não há razão para se sentirem superiores a ninguém.

“Um bom médico também deve praticar a humildade. A medicina desperta muito prestígio, mas isso não deve ditar a tônica do comportamento, dentro ou fora do ambiente de trabalho. Humildade também levará o médico a perceber seus limites, e reconhecer o momento em que, para exercer de forma plena o seu ofício, precisará recorrer à pesquisa, aos estudos e aos colegas.”[2]

Uma atitude de desrespeito para com os pacientes  resulta em falta de confiança em toda a classe médica e causa ainda mais demandas judiciais contra médicos. 

Exercer a humildade e a empatia não dói e ainda pode ser a cura!

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Referências:


Direito de Escolha do Menor em Lisboa

Tribunal da Relação de Lisboa Íntegra da Reportagem Um jovem de 16 anos diagnosticado com leucemia aguda  recusa-se a receber qualquer trans...