A Defensoria Pública de São Paulo entrou
com um pedido na Justiça para acabar com o processo contra 30 mulheres acusadas
de terem praticado o aborto, sob a alegação de que essas mulheres são em sua
maioria pobres, já possuem outros filhos, são cuidadoras e provedoras dos lares,
não possuem antecedentes criminais e que o direito à vida não pode ser
compreendido apenas na perspectiva de se estar vivo, mas de viver com dignidade.
A Defensoria argumenta que a criminalização
do aborto é incompatível com a Constituição de 1988, como em seu princípio da dignidade da pessoa humana,
do qual deriva o direito à autodeterminação
sobre o próprio corpo. Também aponta que a criminalização viola os direitos
à inviolabilidade da intimidade e da
vida privada e ao livre planejamento
familiar.
A dignidade da pessoa humana é um dos
princípios fundamentais da República Federativa do Brasil e está relacionada
com a própria condição humana, é uma qualidade inerente aos seres humanos
enquanto entes morais e éticos, é sua integridade moral, inspira respeito e
consciência de si mesmo, sendo a origem de todos os direitos fundamentais. A
dignidade humana é um conceito evolutivo, dinâmico e abrangente. É o direito de
viver, de viver bem, direito de ser reconhecido e respeitado como pessoa
perante a lei, e de ter seus direitos preservados e garantidos.
Muito embora a lei garanta personalidade
civil apenas após o nascimento com vida, não deixa de garantir os direitos do
nascituro, ou seja, daquele que irá nascer, que foi gerado mas ainda não nasceu.
O
artigo 2º do Código Civil[1] declara:
A personalidade civil da pessoa começa do nascimento
com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro.
O direito à vida é superior aos demais
direitos dos homens e é pré-requisito para o exercício de quaisquer direitos
inerentes ao indivíduo, portanto, deve ser respeitado preliminarmente como
sendo de indiscutível importância, de modo que atinge o nascituro mesmo nesta
condição suspensiva de direitos.
Segundo a visão genética da ciência, a vida
começa com a fertilização, quando o espermatozoide e o óvulo se encontram
combinando seus genes para a formação de um novo indivíduo com um conjunto genético
único. Embora a fecundação seja necessária, porém, não suficiente para o
embrião se desenvolver, todos nós começamos a partir da fecundação de um óvulo.
A vida que o direito protege é a vida desde a sua concepção, a partir daí o
óvulo fertilizado se torna integrante da humanidade e é digno de respeito, tem
o direito de evoluir e de se tornar um indivíduo adulto com vontade própria.
Sendo uma vida de fato, o nascituro possui
os mesmos direitos de qualquer pessoa como ser humano. Se o embrião se
desenvolver e nascer com vida, a ele serão assegurados todos os direitos
inerentes aos já nascidos, deve ser protegido pelo que representa como
viabilidade autônoma de um ser humano.
Uma vez que o nascituro é também detentor
do direito à vida, porém ainda dependente, a responsabilidade de protegê-lo cabe à genitora, sendo que ao
Estado cabe a sua proteção para que nada atente contra a vida do feto, interrompendo
a vida que se desenvolve em seu útero.
O
Código Penal[2] assim prevê o crime de Aborto:
Aborto provocado pela gestante ou com seu
consentimento
Art. 124 - Provocar aborto em si mesma ou consentir
que outrem lho provoque:
Pena - detenção, de um a três anos.
Aborto provocado por terceiro
Art. 125 - Provocar aborto, sem o consentimento da
gestante:
Pena - reclusão, de três a dez anos.
Art. 126 - Provocar aborto com o consentimento da
gestante:
Pena - reclusão, de um a quatro anos.
Parágrafo único. Aplica-se a pena do artigo anterior,
se a gestante não é maior de quatorze anos, ou é alienada ou debil mental, ou
se o consentimento é obtido mediante fraude, grave ameaça ou violência
Forma qualificada
Art. 127 - As penas cominadas nos dois artigos
anteriores são aumentadas de um terço, se, em conseqüência do aborto ou dos
meios empregados para provocá-lo, a gestante sofre lesão corporal de natureza
grave; e são duplicadas, se, por qualquer dessas causas, lhe sobrevém a morte.
Ser favorável ao
aborto é ser favorável à lei do mais forte, é desconsiderar o direito de um ser
dependente e indefeso. O
aborto é crime e assim deve ser considerado para que não se minimize o valor da
vida.
A pobreza não pode
ser desculpa para o cometimento de um crime. Trata-se de um problema do Estado,
quando o dever jurídico de um sujeito é desviado de sua função, seja por abuso
ou por omissão, caberá intervenção do Estado para atender os direitos de quem a
ele estava sujeito, mas o Estado não pode legalizar o aborto como forma de solução
para a questão da incapacidade de criar mais um filho. Cabe ao Estado respeitar
a autonomia da genitora enquanto não resulte em abuso do poder.
Há a necessidade de
uma política eficaz no que se refere ao planejamento familiar. Deve haver uma
política de prevenção e educação sexual com medidas razoáveis a fim de se
evitar doenças e gravidezes indesejadas.
A Constituição Federal, no artigo 5º caput[3] declara: “Todos
são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito
à vida,..”.
Em virtude do princípio da inviolabilidade do direito à vida, é
vedada a pena de morte, a tortura e o tratamento desumano ou degradante. Sendo
a vida inviolável, a prática do aborto de forma legalizada anularia o artigo acima
referido como cláusula pétrea dos direitos e garantias fundamentais.
A descriminalização
do aborto faz parte de algumas bandeiras do movimento feminista, que luta pelo
direito da autodeterminação sobre o próprio corpo. Algumas bandeiras em
particular do movimento merecem grande atenção, como a violência contra a
mulher, a diferença salarial entre gêneros, pouca inserção feminina no meio
político, casos de assédio e preconceito contra a mulher, necessidade de exames
preventivos e maior informação, acesso a métodos contraceptivos gratuitos e
amamentação em lugares públicos, etc.
Entretanto, em
decorrência das suas conquistas, o movimento tornou-se o câncer metastático da
sociedade atual, onde espalham suas vontades a todo custo desconsiderando o
direito alheio. O princípio da autodeterminação sobre o próprio corpo jamais
pode ser alegado em detrimento do direito de outrem. A autonomia da vontade jamais
pode interferir no direito alheio. A famosa frase "A liberdade de cada um termina onde
começa a liberdade do outro", atribuída ao filósofo inglês Herbert
Spencer, indica que a verdadeira liberdade respeita o próximo, e o seus
direitos. Portanto, a liberdade da autodeterminação sobre o próprio corpo não
deve suprimir o direito do bebê por nascer, pois este já é sujeito de direitos.
As feministas não
estão preocupadas com as mulheres pobres que se submetem à abortos
clandestinos, mas estão preocupadas apenas com a sua liberdade de decidirem sobre seus próprios corpos em detrimento de
vidas inocentes concebidas sem critérios ou responsabilidades.
Além do mais, há
inúmeros métodos contraceptivos disponíveis já conquistados por elas para garantir a liberdade sexual e
o planejamento familiar sem a necessidade da prática do aborto.
A indução do aborto
no Brasil é um problema de saúde pública, de responsabilidade do Estado e, embora
seja crime, é uma prática livre e recorrente. O Estado tem o dever de criar
políticas públicas a fim de conscientizar a população tanto feminina como
masculina sobre o planejamento familiar e sobre a educação sexual.
A descriminalização
do aborto apenas fará com que as mulheres o utilizem como método contraceptivo
e planejamento familiar por meio de um homicídio legalizado.
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Fonte:
AZEVEDO, Álvaro Villaça; LIGIERA, Wilson
Ricardo; et al. DIREITOS DO PACIENTE. Editora Saraiva. 2012.
[1] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm
[2] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del2848compilado.htm
[3] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm